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A IA ressuscita os padrões de corpo “perfeito” que estavam sendo superados em nome da diversidade e estabelece como ideais de beleza imagens que não são reais.
Por Wilson Weigl
A Inteligência Artificial (IA) se integrou a nossas vidas, desempenhando tarefas que antes exigiam inteligência humana, em mecanismos de pesquisa, redes sociais, comércio eletrônico, rotinas corporativas, diagnósticos médicos, cirurgias e inúmeros outros campos. Na área de criação de conteúdo, as ferramentas de IA produzem imagens de homens e mulheres deslumbrantes, se não “perfeitos”. Mas será que a IA está ressuscitando padrões e estereótipos tóxicos de beleza que se acreditava superados em nome da diversidade?
As concepções estéticas da IA não apenas influenciam a construção das percepções sociais de beleza em nível coletivo, mas também têm impacto negativo em nível individual, ao interferir no julgamento que fazemos de nós mesmos, de nossos corpos e características físicas. Para muitos, ela pode afetar a saúde mental e incentivar problemas psicológicos de autoimagem corporal e autoestima.
Embora a IA tenha o potencial de promover a pluralidade dos tipos corporais, a tendência atual parece se inclinar ao contrário: o resgate de antigos cânones de beleza e forma física difíceis, se não impossíveis, de serem alcançados. E o que é pior,estabelecendo como parâmetros de beleza imagens que não são reais.
Será que estamos avançando em tecnologia apenas para retroceder em ética e diversidade?
A IA é um espelho de nós mesmos
Uma imagem do que a IA pensa ser o corpo ideal na verdade é a representação do que gente de carne e osso pensa ser o corpo ideal. As plataformas de geração de imagens de IA podem fazer suas interpretações de como um corpo “perfeito” deve ser. Só que, pelo menos por enquanto, as máquinas não têm ideias originais. Tudo o que fazem é ler, analisar e interpretar dados já existentes, inseridos anteriormente por seres humanos.
Os programadores, chamados “devs”, alimentam e “treinam” os bancos de dados das plataformas e desenvolvem algoritmos e modelos de aprendizado para as máquinas tornarem suas interpretações cada vez mais inteligentes. Já o usuário que usa a plataforma para criar uma imagem ou um vídeo precisa informar as especificações exatas do que deseja por meio de prompts (comandos de texto) que serão analisados pela máquina. A resposta em forma de imagem irá inevitavelmente traduzir os comandos inseridos em prompts.
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O impacto da IA na saúde mental
Apesar de que os modelos estéticos se tornaram mais diversos e inclusivos, e mais homens e mulheres conseguem se enxergar nas mídias e na publicidade, o resgate de antigos padrões estéticos tóxicos pela IA traz de volta as velhas pressões estéticas das revistas, TV e publicidade, que se refletem em insatisfação com o próprio corpo, depressão, ansiedade, distúrbios alimentares e doenças mentais como o Transtorno Dismórfico Corporal, a preocupação excessiva com a aparência, em que se dá importância exagerada a defeitos muitas vezes imperceptíveis para outras pessoas.
Entre esses transtornos corporais está a dismorfia muscular, comportamento compulsivo, mais comum em homens, em que a busca da forma física se transforma no foco central da vida e leva ao overtraining e ao uso de anabolizantes.
IA e estereótipos de gênero
Um grupo americano de conscientização sobre transtornos alimentares, The Bulimia Project, testou geradores de IA, pedindo que produzissem fotos do corpo masculino e feminino “perfeito”. No caso dos homens, 43% das imagens geradas retrataram corpos irreais, como versões “photoshopadas” de fisiculturistas, altos e musculosos, de ombros largos e abdominais definidos. Quase metade das imagens masculinas (47%) apresentou barba, atributo social de “virilidade”.
No universo da fantasia, outra área de criação da IA, as imagens masculinas são vikings, centuriões romanos e gladiadores em atitudes que reforçam os estereótipos de gênero como virilidade, força física e agressividade, quando não violência. Considerando que as mídias usam algoritmos baseados em qual conteúdo é mais atraente, fica fácil adivinhar porque as representações da IA são incrivelmente sexualizadas.
Padrões são fruto de nossas escolhas
Imagens geradas por IA são fruto de nossas próprias escolhas, e as ferramentas de IA são essencialmente um espelho que reflete nossos próprios preconceitos estéticos de volta para nós mesmos.
Cada plataforma tem seu próprio banco de dados, mas apesar do grande volume de informações, as respostas de geração de imagens não são infinitas e são sempre determinadas pelo conjunto de dados inseridos pelos programadores e processados até aquele momento. Se esses bancos não dispõem de dados que expressem diversidade, a resposta da máquina será limitada e padronizada.
IA, inclusão e diversidade da beleza
No entanto, é essencial reconhecer que a criação automatizada de conteúdo visual não é inerentemente negativa. Além de acelerar o processo criativo e ser uma ferramenta poderosa de inspiração e expressão para artistas e designers, quando usada de forma responsável e ética pode promover a inclusão ao mostrar a multiplicidade da beleza e realçar as singularidades individuais. Ou seja, pode desafiar os padrões e normas tradicionais de aparência, desde que “treinada” nesse sentido pelos seres humanos.
Enquanto isso não acontece, nos resta aproveitar a inovação da IA sem colocar a saúde mental em risco com expectativas irrealistas. Reconhecer que essas imagens não são reais e que a beleza existe em todas as formas, cores e tamanhos é crucial para manter uma autoimagem saudável.
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