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Para alguns caras, ir à academia se torna a coisa mais importante do cotidiano. Assim como treinar pesado e crescer mais e mais. É a “dependência do exercício”, um transtorno de imagem.
Por Wilson Weigl
Tem caras que vão à academia sete vezes por semana, sem nenhum dia de descanso. Se têm um tempinho, treinam duas vezes por dia. Sacrificam a agenda pessoal, deixam de curtir, sair com os amigos — até mesmo de fazer sexo — para não faltar aos treinos.
Caras focados e motivados? Não, na verdade. Há o perigo de eles sofrerem de dependência do exercício, um comportamento compulsivo em que a busca da forma física se transforma no foco central da vida. O excesso de atividade física já é classificado em psiquiatria como vício.
Às vezes, essa compulsão em treinar e pegar pesado leva também ao desrespeito aos limites do corpo. O viciado em exercício adota volume e intensidade de treino superiores à capacidade de recuperação do organismo, podendo sofrer lesões. O resultado é a síndrome conhecida como overtraining, o esgotamento com sintomas como fadiga e dores musculares e que leva até à diminuição da imunidade e a alterações hormonais.
A dependência de exercício é comparada ao vício em drogas, álcool ou cigarro. Quando estão impedidos de correr e malhar (lesionados, por exemplo) ou simplesmente faltam um dia na academia, os dependentes experimentam sintomas de abstinência parecidos com os dos viciados em drogas: mau humor, ansiedade, depressão e agressividade. Segundo estudos, no Brasil 42% dos praticantes de musculação e corrida são viciados em exercício.
Esse vício está intimamente ligado a um transtorno de imagem que afeta principalmente os homens: a vigorexia (transtorno dismórfico muscular), o contrário da anoxeria. Assim como um anoréxico sempre se enxerga gordo no espelho, o vigoréxico acha que está magro e precisa treinar mais pesado para ganhar músculos e crescer. Também costumam exibir uma personalidade narcisística, se preocupando em excesso com a aparência e o reflexo no espelho.
Os pesquisadores acreditam que a dependência acontece também porque a atividade física provoca aumento da produção no corpo dos chamados marcadores bioquímicos. São substâncias que desencadeiam alterações responsáveis pela sensação de prazer (e isso em princípio é positivo), como a serotina e a betaendorfina, substância com efeito como o ópio, produzida pelo corpo, que tem efeito analgésico. Juntas, têm ação que desperta mais vontade de se exercitar.
Como toda droga tem seu lado prazeroso, o dependente nem se dá conta da sua necessidade e, além disso, é admirado como exemplo de dedicação à saúde.
Outro ponto a destacar é que frequentemente os viciados em exercício e os vigoréxicos também têm obsessão por controlar a dieta e consumir proteínas e carboidratos em quantidades e horários rígidos. Quando não conseguem se alimentar adequadamente, costumam sofrer com os mesmos sintomas: ficam frustados e deprimidos. Acham que as refeições malfeitas vão comprometer seu plano de construir o corpo perfeito.
QUAIS SÃO OS SINTOMAS DO VÍCIO EM EXERCÍCIO?
Treinar, pedalar ou praticar corrida diariamente não significa compulsão por exercício nem de vigorexia. É preciso identificar em si mesmo vários desses sinais:
- Sentir necessidade de treinar diariamente ou até mais de uma vez por dia.
- Olhar no espelho e achar sempre que está magro e precisa treinar mais pesado.
- Ficar frustrado e com raiva quando perde um dia de treino.
- Sentir que falta “algo” na vida no dia em que não treinou.
- Organizar a agenda colocando como prioridade o treino.
- Deixar de comparecer a encontros com amigos, ir a festas e happy-hours e até de fazer sexo para não faltar à academia.
- Viver obcecado com dieta e viver calculando porções de proteína e carboidratos.
- Ficar numa espécie de “síndrome de abstinência” quando pula um dia de treino.
COMO SÃO TRATADOS OS TRANSTORNOS DE IMAGEM?
A dependência do exercício é tratada com terapia. Para ser mais exato, com terapia cognitiva comportamental: o tempo de terapia é geralmente curto (não se fica anos falando com o psicoterapeuta). Aprende-se a reavaliar os hábitos, mudar a mentalidade sobre a aparência física e colocar o exercício em função das outras atividades diárias. Ou seja, colocar a academia no devido lugar dentro da vida. E não no centro dela.
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