O treino desencadeia uma revolução no corpo, que altera o trabalho dos sistemas cardíaco, respiratório, muscular e cerebral para se adaptar ao esforço.
Por Wilson Weigl
Fotos: Deposit Photos
Um treino de musculação desencadeia uma revolução no corpo. Numa operação sincronizada, os sistemas cardíaco, respiratório, muscular e cerebral se alteram para se adaptar ao esforço. Os efeitos começam logo no começo do treino e se prolongam por um bom tempo depois.
Estudo feito nos Estados Unidos mostrou que quase 10.000 moléculas sofrem alteração durante e após a musculação. O exercício tira o corpo do estado de equilíbrio natural (homeostase) e, para trabalhar com mais eficiência, o organismo incentiva alguns processos fisiológicos e inibe outros. Assim que o treino termina, o corpo tenta voltar o quanto antes ao estado de repouso e ocorre o inverso ao do início do treino e os processos acionados são desativados.
Logo ao sair do estado de repouso o corpo entra em “modo de ação” promovendo ajustes rápidos: aceleração da frequência cardíaca e respiratória (para fornecer mais oxigênio aos músculos), ativação de unidades motoras (que melhoram a conexão entre cérebro e músculo) e disponibilização de glicose e gorduras (para uso como fonte de energia).
Conexão cérebro-músculos
A musculação aperfeiçoa a comunicação entre o sistema nervoso e os músculos, recrutando melhor as unidades motoras (grupos de fibras musculares controladas por um neurônio). À medida que o esforço aumenta, maiores fibras musculares são ativadas pelos sinais elétricos, gerando contrações mais fortes. Essa ativação gera mais força e hipertrofia e otimiza a coordenação e a eficiência na execução dos exercícios..
Aceleração cardíaca e respiratória
No sistema cardiorrespiratório, a frequência cardíaca, a pressão arterial e a respiração são aceleradas, para levar mais sangue oxigenado aos músculos. A digestão fica mais lenta, pois o sangue é desviado para os músculos e o cérebro.
Busca de energia

Como uma máquina que precisa de combustível, o corpo necessita grande quantidade de energia para o trabalho muscular. A principal fonte é o trifosfato de adenosina (ATP), molécula presente em praticamente todas as células do corpo e considerada a “moeda energética” celular, por armazenar e fornecer combustível para a maioria das atividades celulares.
Como o estoque de ATP armazenado no músculo é pequeno, se esgota rapidamente e precisa ser constantemente reposto. Para suprir a demanda de ATP, o corpo utiliza três vias: o sistema fosfagênico (ATP-CP), que utiliza o ATP e a fosfocreatina (CP) já presentes no músculo (leia aqui o post sobre creatina), o sistema glicolítico (anaeróbico lático), que usa a glicose dos carboidratos para produzir ATP, e o aeróbio (oxidativo), que mobiliza carboidratos e gorduras armazenadas no corpo, mas requer oxigénio para converter esses combustíveis em ATP (por isso é mais usado em atividades de longa duração e baixa intensidade, como corrida, e menos em atividades explosivas e de curta duração, como a musculação).
Sensação de bem-estar e recompensa
Em questão de minutos, substâncias químicas cerebrais (neurotransmissores) geram sensação de bem-estar, aliviam o estresse e melhoram o humor. Conhecidos popularmente como “hormônios da felicidade”, esses químicos atenuam os sintomas de ansiedade e depressão e aumentam a disposição, gerando a sensação conhecida como “barato do exercício”.
As substâncias químicas cerebrais mais comumente associadas ao bem-estar mental são endorfina, serotonina e dopamina. A endorfina, considerada um “analgésico natural”, diminui os níveis de cortisol (hormônio do estresse), induz ao relaxamento e diminui a percepção da dor e da tensão muscular. A serotonina regula o humor, o sono e o apetite e seus níveis reduzidos são frequentemente associados a depressão, ansiedade e insônia. A dopamina atua no sistema de recompensa: liberada em situações prazerosas, faz o cérebro associá-las a sensações positivas, incentivando sua repetição. Também atua no controle motor, na atenção, memória e aprendizado.
Descarga de adrenalina
Adrenalina e noradrenalina, produzidas pelas glândulas suprarrenais, aceleram os batimentos cardíacos e aumentam o fluxo do sangue para os músculos. O corpo entra em estado de alerta, para enfrentar o esforço com mais energia, disposição e foco. Os hormônios também mobilizam glicose e gordura do fígado e dos tecidos adiposos como combustível muscular.
Aceleração do metabolismo
O corpo exige grande quantidade de calorias para manter a energia. Mesmo após o treino, o metabolismo continua acelerado por várias horas, queimando gordura corporal na recuperação — esse processo é conhecido como “efeito after burn”. Construir massa muscular aumenta o metabolismo basal (o mínimo gasto de calorias que o corpo precisa para se manter funcionando em repouso). Ou seja, queima-se mais calorias mesmo quando não se está exercitando.
Queima de gordura corporal
Glicose e gordura são e usadas como fonte de energia para o exercício. Essa mobilização provoca perda de peso, pela queima de calorias e da gordura corporal armazenada. Com o tempo, aumenta a capacidade do corpo de usar gordura como fonte de energia.
Circulação de miocinas
As contrações musculares durante o exercício físico são gatilho para a produção e liberação de miocinas, proteínas secretadas pelos músculos, que atuam na regulação do metabolismo, da saúde cardiovascular e da função cerebral, além de terem efeitos protetores contra diabetes, câncer e doenças cardíacas. Essas proteínas atuam não só nas células musculares locais como também circulam pela corrente sanguínea até células distantes de outros órgãos e tecidos, como cérebro, ossos, fígado, pâncreas, intestino e pele.
Entre as principais miocinas estão a irisina, que converte a gordura branca, armazenada como reserva energética, em gordura marrom, aliada em processos de emagrecimento, a interleucina-6, que tem efeito anti-inflamatório, e a interleucina-15 (IL-15), relacionada ao aumento da massa muscular e diminuição da gordura corporal.
Liberação de hormônio do crescimento
O treino também é um potente estímulo fisiológico para a secreção da somatotrofina (GH), o hormônio do crescimento, que estimula o crescimento e a reparação celular, a queima de gordura corporal e melhora a recuperação.

Adaptação e efeitos a longo prazo
Com a progressão dos treinos, o corpo se adapta e melhora sua capacidade de suportar os esforços futuros, aumentando resistência e força muscular. Há também melhora da eficiência do coração: o músculo cardíaco fica mais forte, bombeando mais volume de sangue a cada batimento e fornecendo mais oxigênio e nutrientes aos tecidos.
Seja o primeiro a comentar